Na manhã de quarta-feira, 19, agentes de segurança invadiram o residencial Trentino I localizado no bairro Itinga, com muita truculência, usando cavalaria, helicóptero, arrombando portas e agredindo moradores e moradoras. Chegaram às 6h30 e ficaram até às 10h. Cortaram os gatos (ligações clandestinas) e a energia de quem tinha pagamentos atrasados. Policiais bateram e espancaram pessoas na frente dos moradores, assediaram mulheres e revistaram as mochilas de crianças.
Segundo as pessoas que moram no local, eram mais de 200 policiais. Levaram 38 pessoas para a delegacia, na maioria mulheres e mães. De acordo com relatos dos moradores, a Celesc exige que as dívidas sejam pagas em parcela única, sem a possibilidade de negociação. Além disso, afirmaram que se o total for pago, vão pensar na possibilidade de religar a luz. Os moradores detidos ficaram quase oito horas na delegacia, enquanto as crianças ficaram desassistidas, sem a presença dos responsáveis.
Um morador relatou que os agentes chegaram gritando “Polícia! Polícia!” e palavras de ofensas para sua família. Ele deve R$ 4.000 e exigiram pagamento na hora para não ser detido. Na delegacia teve que pagar fiança. “Eu sou pobre, como vou conseguir pagar uma dívida de R$ 4.000?”, questionou.
Outra moradora, que estava há apenas 10 dias morando no apartamento, também foi presa por causa de dívidas deixadas pelo antigo morador do apartamento. Enquanto ela estava detida, o filho ficou com amigo do marido. Ficou presa das 10h às 18h, passando fome na delegacia.
Uma mãe teve o filho levado para a delegacia, mas voltou no final da tarde com pagamento de fiança. Segundo ela, deve R$ 5.000 de energia elétrica e a Celesc exige o pagamento integral.
Outra moradora entrevistada reclamou de uma taxa administrativa no talão de luz que é de aproximadamente R$ 140. Segundo ela, a taxa é mais alta do que o consumo mensal. Os vizinhos relatam que não recebem essa cobrança extra. A moradora adquiriu uma dívida de mais de R$ 400 de uma cobrança possivelmente indevida. Durante esse período, procurou a Celesc para esclarecer tal cobrança, mas não conseguiu resposta. Com a dívida crescendo, recorreu ao “gato”.
A mãe relata ainda que estava saindo para trabalhar quando tudo aconteceu. Voltou para o apartamento por causa da companheira, não queria deixá-la sozinha com os policiais. “Tu é mulher, como faz gato?”, foi o que agentes de segurança pública perguntaram quando ela foi detida. Durante a semana, a moradora vai ao Procon recorrer com ajuda da filha. “Tem gente que não paga pois não deixam regularizar.”
Ela fez questão de criticar a mídia comercial da cidade, que divulga falta de segurança para as crianças, mente que elas não conseguem brincar na rua por causa do crime, quando a realidade é diferente. “As crianças brincam sim, tem espontânea vontade”.
Vários moradores tiveram o relógio retirado por conta do “gato” ou por atrasos na conta. A retirada do relógio obriga o titular a pagar multa de reinstalação.
Um homem que pediu para não ser algemado na frente dos filhos foi espremido no banco de trás do camburão. Ainda relatou que as algemas foram apertadas ao ponto de lhes causarem dor.
No local, há pessoas endividadas desde o começo do residencial, porém a Celesc não quer negociar. Eles cobram uma taxa de religação da energia. Levaram o relógio de uma mãe que tinha apenas duas parcelas atrasadas, uma delas, de setembro do ano passado.
Outra mãe que teve o apartamento invadido falou que teve o lar todo revirado por policiais. O marido foi agredido com dois socos na sua frente. Muita coisa estragou no apartamento dela, os alimentos foram jogados no chão e um carregador portátil sumiu depois da invasão. Apontaram armas para a família que tem várias crianças pequenas. Contou que o abuso policial é recorrente com as famílias do residencial. Em outra operação, agrediram seu filho. A moradora tem filhos cumprindo pena na prisão, então foi provocada pelos agentes. “Tu é vagabunda, vamos jogar seus filhos na valeta”, disseram os policiais.
Ela ainda reclamou do estigma sofrido e da sua situação difícil. “Vocês estão levando o meu marido, mas já entreguei meu currículo em vários lugares, tento conseguir emprego, mas nunca consigo”, lamentou.
O ato contra a paz dos moradores e moradoras fez parte da Operação Prometheus II, realizada pelas polícias militar, civil e do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). Ironicamente, em matéria publicada no A Notícia, a delegada regional de Joinville disse que “o intuito é melhorar a sensação de segurança para os moradores desses condomínios”.
Posted on 30/09/2018 by CABN
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