Carta de abertura do V Sarau 1º de Maio

Boa tarde companheiras e companheiros!

É com a nossa alegria rebelde e amorosa que iniciamos mais uma tarde de sarau, o nosso V SARAU 1º DE MAIO, realizado pelo Coletivo Anarquista Bandeira Negra, integrante da Coordenação Anarquista Brasileira.

Estamos presentes na cidade há oito anos e há cinco realizando o Sarau. Neste tempo, estivemos acompanhando a conjuntura, envolvidos nas diferentes lutas populares, seja no campo estudantil, comunitário ou sindical, sempre no esforço de construir as diferentes lutas sociais contra todas as formas de opressões e explorações.

A partir da organização e da resistência dos de baixo, o Sarau, mesmo com suas limitações, buscou reunir as diferentes manifestações artísticas e culturais das classes oprimidas. Nosso objetivo também é ser oposição a cultura da “ordem” e da falsa “paz social” presente em Joinville. Socializamos “as expressões artísticas que a companheirada deixa guardada nos cantos do seu quarto, até mesmo numa caderneta surrada na sua mochila.” O Sarau foi feito para ser o momento para dividir o pão e a poesia, o bolo e a canção, a bebida e a fotografia, os biscoitos e teatros baseados no amor e na rebeldia.


Na atual conjuntura, enquanto anarquistas organizados politicamente, é importante discurtir o atual momento político e os duros ataques que nos chamam para organização e resistência.

“No dia 20 de fevereiro de 2019, após meses de especulação do mercado financeiro, chantagem dos grandes empresários e publicidade pesada da mídia corporativista, o governo Bolsonaro entregou na Câmara dos Deputados a tão cobiçada Reforma da Previdência. Finalmente a classe trabalhadora brasileira conheceu qual será o tamanho do ataque que vem pela frente através da caneta dos de cima.

Como já era previsível, o projeto de Paulo Guedes é ainda mais duro do que o apresentado por Temer. Essa reforma significa mais retirada de direitos de trabalhadoras e trabalhadores.

Dentre os pontos mais críticos da proposta do governo Bolsonaro, está o aumento da idade para a aposentadoria. Para ter acesso ao benefício, as idades mínimas passarão a ser de 65 anos para os homens e 62 para mulheres. O tempo mínimo de contribuição também aumentará de 15 para 20 anos, e para receber o valor integral da aposentadoria, o trabalhador terá que contribuir por 40 anos! Um tempo escravizante para a realidade do emprego no Brasil. Aliada à Reforma Trabalhista e seu decorrente aumento do trabalho informal, intermitente, pejotização etc, a Reforma da Previdência irá significar que contribuiremos a vida inteira e não receberemos nada dessa contribuição. Calcula-se que o(a) brasileiro(a) levaria 53 anos a partir da entrada no mercado de trabalho para poder se aposentar com 100% do valor do benefício, praticamente a destruição da Previdência pública. Recentemente o governo Bolsonaro decretou sigilo em relação aos estudos que embasam a tal necessidade da reforma, impedindo o povo de ter acesso e informação daquilo que é seu por direito, os assuntos públicos.

Além disso, o acesso à aposentadoria pelas mulheres será ainda mais difícil. A combinação entre a idade e o tempo de contribuição ficou mais dura. A estrutura machista da sociedade faz com que o tempo de contribuição seja mais curto, já que o desemprego é maior e muitas mulheres com crianças sequer são contratadas em algumas empresas. E como os salários das mulheres são mais baixos em relação ao dos homens – ainda menores para as mulheres negras – o valor final da aposentadoria também vai ser menor.

Outro ponto é o “gatilho automático”, que determina que sempre que aumentar o índice estipulado pelo governo para medir a expectativa de vida, automaticamente aumenta o tempo para a aposentadoria. Bolsonaro e as classes dominantes querem impor aos trabalhadores o pagamento da “crise” para a manutenção de seus lucros e de seu poder, em mais uma medida que amplia o avanço nefasto do Estado Policial de Ajuste, oprimindo, explorando e precarizando ainda mais a vida do trabalhador.

QUAL O PANO DE FUNDO DESSA REFORMA? QUEM GANHA SÃO OS BANCOS!

O governo diz que essa reforma é necessária para o país crescer e reduzir os déficits das contas públicas. Conversa fiada! Essa reforma beneficia somente os bancos e grandes empresários. Ela significa, na realidade, menos direitos e mais miséria para as trabalhadoras e  trabalhadores brasileiros.

Além de ferir de morte a aposentadoria pública, a proposta abre caminho para o mercado financeiro. Com uma aposentadoria mais difícil de ser acessada e com valores mais baixos do benefício, deve crescer o mercado da previdência privada. Cumprindo assim a agenda neoliberal que, para garantir mais lucros aos bancos, prega a redução dos gastos sociais do Estado. Receituário que impôs enormes retrocessos, como a Reforma Trabalhista, a terceirização irrestrita e a Emenda Constitucional 95 — que congela por 20 anos os investimentos públicos, ou seja, 20 anos sem aumento no valor de investimentos para a saúde e educação. A Reforma da Previdência, que Temer não conseguiu aprovar, é o que faltava nesse pacote de ataques do capital financeiro.

Se é boa para os bancos, ela é péssima para o trabalhador! Paulo Guedes e Bolsonaro pretendem criar para a Previdência um regime de capitalização privatizado, em que cada trabalhador recolhe para a própria aposentadoria  a exemplo do que foi implantado na sangrenta ditadura militar de Pinochet, no Chile. Sob a doutrina da Escola de Chigago (seguida por Guedes), o país latinoamericano entregou a gestão das aposentadorias para entidades privadas. O resultado foi péssimo para o povo: mais de 90% dos beneficiados recebem pouco mais da metade do salário mínimo chileno. Às bordas da miséria, a taxa de suicídio de idosos tem crescido a cada ano: entre 2010 e 2015, 936 chilenos com mais de 70 anos tiraram suas próprias vidas. Desastre para trabalhadoras e trabalhadores, lucro para empresários. As Administradoras dos Fundos de Pensão, formada por multinacionais (inclusive o banco BTG Pactual, fundado por Paulo Guedes), ano a ano fecham suas contas com enormes taxas de lucros. Em 2018, elas somaram mais de 450 milhões de dólares em lucros, o equivalente a mais de R$ 1,7 bilhão. Importante lembrar que, nesse modelo, os empregadores e o governo não fazem contribuições. Nos últimos anos, a população vem pressionando para que o país volte a adotar o sistema solidário, que é o modelo brasileiro atual.

O TRABALHADOR NÃO VAI PAGAR ESSA CONTA!

Os  empresários e governos argumentam que a Reforma da Previdência é urgente por conta de um déficit, cujos cálculos utilizados são no mínimo questionáveis. Por exemplo, quando falam em déficit não mencionam o desvio dos recursos da Previdência e da Seguridade Social feitos por todos os governos, através sobretudo da chamada DRU (Desvinculação das Receitas da União). Esse mecanismo permite ao governo tirar recursos da Seguridade Social (formada por Previdência, Saúde e Assistência Social) para usar em outras áreas que achar necessário. Desde Temer, o percentual permitido passou de 20% para 30%. Claramente uma forma de retirar verbas dos direitos sociais para pagar os juros da dívida pública. Além do calote de grandes empresas, que não pagam o que devem à Previdência. São quase R$ 500 bilhões de dívidas de empresas com o INSS. Não somos nós que devemos pagar essa conta!

Mesmo a inclusão na reforma de setores como os militares, políticos e a alta burocracia do funcionalismo público não justifica a proposta, já que quem tem salários maiores tem condições de poupar para a aposentadoria. Essa manobra não passa de um disfarce para tentar ganhar apoio do povo, mas o fato é que a aposentadoria dos mais pobres vai ser ainda mais precária.

CONSEQUÊNCIAS DA REFORMA

Caso seja aprovada, essa reforma vai gerar ainda mais pobreza e jogar na miséria grandes contingentes da população mais pobre. Com a precarização do SUS e de outros serviços públicos como a Educação, vai crescer o trabalho informal, ou seja, sem direitos como 13º, seguro desemprego e PIS, o próprio desemprego irá crescer, além de dificuldades dos mais jovens para entrar no mercado de trabalho. A criação da carteira verde e amarela, que prevê menos direitos trabalhistas, é outra punhalada na Previdência, o que somado com os outros fatores, vai quebrar de vez o sistema.

O pacote traz ainda mais maldades, como o pagamento de um salário mínimo a idosos pobres somente a partir dos 70 anos, redução de até 40% no benefício de quem ficar incapacitado, e o fim da multa de 40% do FGTS para aposentados que estejam trabalhando, e sejam demitidos. Professoras(es) e trabalhadoras(es) rurais terão que trabalhar ainda mais, sendo essas algumas das consequências dessa proposta nefasta que começa a ser discutida no Congresso.

ORGANIZAR A LUTA DESDE A BASE!

Enfraquecidas economicamente e há muito tempo acostumadas com reuniões de gabinete, as grandes centrais sindicais ainda apostam nas negociações no Congresso e na desarticulação do governo com as bancadas na Câmara. Ainda estão distantes de começarem a construção de uma dia nacional de paralisação.

Agonizando, o sindicalismo tradicional burocratizado é incapaz de mobilizar trabalhadoras e trabalhadores e acaba por repetir as mesmas fórmulas e repertórios de ação, com dirigentes discursando em cima de carros de som, o que tem sido incapaz de construir uma luta popular de resistência contra os ataques dos governos e patrões.

É necessário criar uma forte campanha de luta contra a Reforma da Previdência, com um repertório de ações que vá além dos discursos das centrais. A história mostra que nossos direitos foram conquistados a defendidos pela luta popular, nas ruas. Por isso, não dá para entregar a defesa de nossas aposentadorias às mãos dos políticos e seus conchavos. Não será o jogo de negociações no Congresso que vai barrar essa proposta. É a luta cotidiana nas ruas, nos locais de trabalho, de moradia e de estudo, com vistas à radicalização em uma Greve Geral, que vai mostrar a nossa força e sepultar a Reforma da Previdência.”

Só com a luta podemos barrar a reforma da previdência, como foi a partir da luta, a greve, o povo na rua que conquistamos as oito horas de trabalho, que conquistamos salários mínimos, que conquistamos nossos direitos. É lutando, paralizando as ruas e as fábricas que vamos garantir que não tirem nossa dignidade e nosso pão de cada dia. Só a luta e a resistência da população vai impedir que a Reforma da Previdência aconteça.

Lutar criar poder popular!